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quinta-feira, 22 de março de 2012

Gestão Sustentável

 O gestor sustentável do século XXI

O desafio do líder gestor hoje é conseguir ter uma visão sistêmica, que seja capaz de se reeducar e educar seu colaborador em justiça social, cidadania e profundo respeito pela natureza. Sabemos fazer crescimento, estamos longe de saber fazer desenvolvimento sustentável.

Por Nadia Rebouças, é Colunista de Plurale, colaborando com artigos sobre Sustentabilidade. É sócia da Rebouças & Associados e trabalha com Comunicação para a Transformação.

Fonte: Plurale

O título deste artigo não seria entendido há 20 anos. A palavra sustentabilidade causaria surpresa para a maioria e mesmo o conceito de gestor, não tinha a popularidade que alcançou. Nos últimos anos o papel da liderança, do gestor ganhou grande destaque dentro das empresas, do governo, organizações socioambientais e em todas as áreas de ação da sociedade civil.

Um pouco de história
Em 1992, quando aconteceu a Eco 92, no Rio de Janeiro, o conhecimento sobre as ONGs, as questões ambientais e os desafios climáticos ficavam restritos a círculos de especialistas. As ONGs chegaram ao Brasil pelas mãos de intelectuais que sofreram a diáspora provocada pela ditadura. Foram líderes que estimularam o caminho para a democracia e que, depois da anistia, voltaram trazendo um novo conceito de trabalho: trabalhar causas sociais, ambientais e políticas com o apoio financeiro de ONGs internacionais. Uma geração de instituições, nascida nos anos 80, começou a ocupar um importante espaço de pesquisa, análise e denúncia. O sociólogo Betinho, criador do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) há 30 anos foi um deles. Chegou ao Brasil com Carlos Afonso trazendo um microcomputador debaixo do braço, o que acabou conferindo ao Ibase o pioneirismo ao lançar o primeiro provedor de internet: o Alternex. Nasceram aí lideranças muito importantes, preocupadas com justiça social.
Com a Eco 92 surgiram as ONGs mais voltadas para as ações diretas na sociedade. Com o aparecimento da Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e pela Vida (1993), campanha que levou os brasileiros a tomarem consciência da fome que atingia parte significativa da nossa população, houve um estímulo definitivo ao voluntariado, expandindo também o conceito de ONG. A formação de líderes na ação social e ambiental foi intensificada. As chamadas organizações não governamentais começaram inclusive a ser financiadas por empresas públicas.
Apesar da resistência às empresas, Betinho assumiu a convocação de todas elas a agir contra a fome. Foi a primeira vez que empresários e gestores foram convocados a agir socialmente. O anúncio onde aparecia uma avestruz, publicado gratuitamente em jornais e revistas, foi o primeiro passo para trazer as empresas para a campanha Ação da Cidadania, que mais tarde originou o Comitê da Ação da Cidadania de Empresas Públicas (Coep), Pouco tempo depois, o IBASE lançou o Balanço Social, um modelo de indicadores sociais que conferia às empresas um selo de adesão e compromisso. Para tanto, Betinho perguntava aos empresários qual era a “razão social” da sua empresa? E, a partir de então, surgiram as lideranças empresariais que começaram a influenciar a responsabilidade social empresarial.
O empreendedorismo foi e continua sendo um foco importante. Não é possível construir uma nova forma de viver sem líderes. Avina, Ashoka, organizações internacionais, investiram em empreendedores sociais que nasceram nesse período: Renascer, os Doutores Alegria, o CDI, só para citar alguns exemplos. Descobriram o potencial das mulheres como líderes comunitárias e em muitos projetos sociais investiram na capacidade feminina de geração de renda.
A mudança da sociedade fez com que a velha filantropia já não respondesse mais à necessidade de uma participação ativa das empresas. Nasceu o marketing social. Betinho conseguiu envolver as mídias no apoio à sua campanha. Na TV, de 1993 a 1997, foram veiculados cerca de 35 filmes alguns com depoimentos de Gil, Caetano e Tom Jobim. As empresas investiram em promoções e voluntariado, A propaganda começou a construir a imagem de “empresa cidadã”. Ainda não se falava em responsabilidade social, conceito incorporado ao dia a dia das empresas e da sociedade no final da década.
Em 1998, surge o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social (Ethos), criando pela primeira vez um trabalho estruturado que educa as empresas a refletir sobre o compromisso que deveriam desempenhar na sociedade. Os problemas históricos do Brasil, como a desigualdade e a injustiça social, não eram apenas problemas da esfera governamental, o papel das empresas não compreendia apenas o pagamento de impostos. O Instituto Ethos (que reúne empresas) e o Gife (que reúne institutos e fundações) investiram na educação para os novos tempos. As empresas começaram a estruturar seus próprios institutos e fundações, a escolher temas de atuação, a investir em tecnologias sociais, a lançar editais de apoio a ações culturais, sociais e, mais tarde, esportivas e ambientais. De lá para cá vivemos claramente a conquista de um aprimoramento do conceito de responsabilidade socioambiental, mas muitas vezes convivendo com intenções, nem sempre nobres, dessas atividades.

O Gestor
Os líderes empresariais, estimulados pelos profissionais de marketing e comunicação, começaram a perceber que “ser” responsável, ou “parecer”, podia significar uma estratégia diferenciada e ajudar a construção da imagem da empresa. Muitas começam a fazer o Balanço Social e vão aos poucos entendendo que ele não era o espaço para confirmar seu índice de “bondade”, mas, de fato, para gerar indicadores para sua própria transformação. Ou seja, pela primeira vez fala-se em gestão, já que conhecer a situação atual é o primeiro passo para poder planejar com consciência o futuro. Quantas mulheres na empresa, quantos negros, quais as diferenças salariais, os investimentos em treinamento, saúde e alimentação. Os líderes dos RH começam a se ver como área de desenvolvimento humano nas empresas e passam a ter um papel mais estratégico. A área de comunicação interna descobre que precisa mudar a consciência dos empregados. São eles que constroem relacionamentos nas comunidades. No início ainda falavam em “comunidades do entorno”, o que claramente demonstrava o egocentrismo do setor. Não se apresentavam, não pediam licença para entrar. Então surgiram os processos de licenciamento e audiência pública, que iniciaram uma mudança da conversa com as comunidades, mesmo que até hoje muitos entendam a função do relacionamento com comunidades como a ação para “blindar a empresa”.

O desafio de operar com gestores em formação
Nosso planeta gritando por socorro despertou a reflexão dos que atuavam no ambiental e no social e que começavam a construir um novo caminho. Popularizou-se o Triple Botton Line e a percepção de que sem uma nova economia não nascerá uma nova civilização. O conceito sustentabilidade ganhou enorme popularidade, quase afetando a sua credibilidade. Peter Senge adota o termo “desenvolvimento sistêmico” referindo-se ao conceito de sustentabilidade. Conseguir pensar no todo. Desde os meus primeiros artigos sobre o tema, lá na década de 90, afirmo que se não construirmos pontes entre as áreas, entre os setores, entre as pessoas, não conseguiremos construir o novo mundo. Há uma enorme diferença entre ser gestor da sua própria área ou ser um gestor com visão sistêmica.
A gestação da economia verde e inclusiva não se cumprirá sem uma nova liderança, sem gestores comprometidos e competentes, nas empresas, no governo e na sociedade civil. Aí estão muitos livros que discutem essa questão. Muitas metodologias de diálogos, de encontros, têm se concretizado na tentativa de formar profissionais que as universidades não produziram na última década. Faltam gestores nas empresas, nas organizações sociais e ambientais e, especialmente, na educação: um profissional preparado para enfrentar problemas, sensível para o que tem vida, que sabe conversar, tem paciência e habilidade de articulação, humildade, que valorize efetivamente as pessoas, livre de preconceitos e que consiga operar a partir de uma visão sistêmica.
As empresas assumiram compromisso com a sustentabilidade. Difícil ler a missão ou a visão de grande empresa e não encontrar referências quanto à responsabilidade socioambiental ou sustentabilidade. Até as médias e pequenas empresas já estão mobilizadas para essas questões. Mas ainda é difícil, conhecendo as empresas por dentro, ver isso de fato acontecendo. Presidentes de grandes empresas e alguns líderes perceberam nos últimos anos que não há mais condição de permanecer no mercado sem mudar paradigmas. Não são poucas as mudanças: Coca-Cola e McDonald’s adaptam seu portfólio de produtos para atender à sociedade, que começa a fazer novas escolhas. No entanto, ainda há resistências das empresas, pois manter a fórmula tradicional dos produtos afeta menos o lucro do que investir em novas tecnologias. Para uma geração de executivos que mede suas metas em dinheiro no bolso no final de cada ano a decisão não deixa dúvidas. Muitos “cases” de transformação empresarial nasceram após denúncias. Como na nossa vida pessoal a crise gera mudança. O desastre tem um papel na construção do futuro. Aconteceu com a Petrobras e o vazamento na Baía de Guanabara, com a Nike e está acontecendo nesse momento com a Chevron. Uma nova liderança possibilita a mudança de inúmeras empresas, e algumas pequenas já nascem sustentáveis. Investem em novas tecnologias e no sonho, na visão de novos comportamentos. Isso tem sido muito estimulante. Da mesma forma, me impressiona o número de e-mails que recebo de profissionais insatisfeitos com seus gestores e com o “discurso” das empresas sem “fatos” na realidade. Andamos, mas temos muito para caminhar. Colaboradores começam a escolher empresas para trabalhar considerando o ambiente interno e as possibilidades de fazer seu trabalho ser efetivamente uma oportunidade para mudar o mundo.
Aos poucos, o consumidor passa a ser o gestor de seu corpo e de sua mente. Escolhe. Os jovens através das redes sociais têm realmente formas de interferir na sociedade, como tem sido provado ao longo deste ano. Há novas lideranças nas ruas, nas praças e nas redes sociais. A TV já não pauta suas mentes, fogem dela e ocupam a internet. Cada vez temos mais interlocutores e menos consumidores, coisa que observo há anos. Aparece uma nova geração de mães que questiona os produtos e a publicidade para seus filhos. O Instituto Alana, que começou há três anos essa luta e se destaca com profissionais jovens, altamente preparados, que poderiam estar em qualquer empresa, mas escolheram trabalhar naquilo em que acreditam. Tudo ficará muito difícil para as empresas que não perceberem que a sociedade mudou e continua a mudar, já que jornalistas e publicitários sem diploma ou emprego multiplicam-se exponencialmente. Fazem por paixão, por acreditar, voluntariamente. Aí encontramos a profunda diferença entre esses grupos ativos da sociedade civil e os empregados das empresas. Um dia me vi perguntando numa palestra: Como conquistar nos nossos empregados o espírito do voluntariado? Não adianta o presidente querer, o diretor ordenar, as missões escritas nos sites se, e especialmente, a liderança das empresas não perceber o seu papel de gestora, animadora, inspiradora e educadora.
A comunicação interna tem conquistado importância estratégica nos últimos anos, exatamente porque saiu do endomarketing para mergulhar na educomunicação. Dr. Ana Luiza Almeida, do Instituto de Reputação, declara com toda razão nas suas palestras: “As empresas hoje só são donas de sua imagem, não mais donas de sua reputação de marca”. A reputação da marca fugiu para a mão dos interlocutores. Quantos gestores têm consciência disso? Muitos CEOs e novos líderes já perceberam. Mas eu escuto afirmações de gestores que às vezes me surpreendem. Ao ver uma frase de Ricardo Voltolini no Facebook e percebo que não sou só eu que me surpreendo: “Quando o principal dirigente diz – entre os mais próximos, claro – que sustentabilidade “custa caro” e que só vai investir em produtos sustentáveis quando o consumidor estiver disposto a “pagar o preço” ou quando o governo oferecer algum tipo de “incentivo”. Bem, ao que tudo indica, essa empresa poderá pagar alto preço pela miopia.
Definitivamente estamos longe de estruturas empresarias que contemplam a visão holística na sua gestão. Conseguir somar pode representar uma grande oportunidade para posicionar uma empresa para o futuro. Sustentabilidade é um conceito que fala do todo. Como podemos gerir o todo pelas partes? Construímos um mundo em cima do modelo da dominação, como nos desvenda Riane Eisler no livro O poder da parceria: “No modelo de dominação alguém tem que estar por cima e alguém por baixo (…) o modelo de dominação é desagradável, dolorido e contraprodutivo. No entanto, convivemos diariamente com ele e com suas consequências”. A estrutura das empresas hoje produz dor, desafio, e raramente prazer e realização no trabalho. Quando cada um está lutando pelo seu ganha-pão, pelo seu reconhecimento, como vamos construir uma empresa sustentável? Quando o tercerizado ou o fornecedor, a comunidade é uma coisa e o colaborador é outra? Quando as relações de trabalho são baseadas na desconfiança e não no diálogo ou na parceria?
A maioria dos nossos gestores ainda cumpre tabela. “Agora é assim que querem que eu faça e assim vou levando”. Não vai adiantar. Cada um de nós precisa se modificar, enfrentar seus “bichos”. Fomos treinados para sermos competitivos. Engenheiros não estudam gente, mas hoje devem ser gestores de pessoas. Temos hoje uma quantidade enorme de trabalhadores do PAC que atravessam o país em busca de oportunidades profissionais, sem qualquer preparo. Como vão respeitar o meio ambiente, a população local e evitar a proliferação de bebês, prostituição, drogas e violência? Conhecem história do Brasil, geografia, biomas, aprendem ao longo da vida a valorizar espécies animais ou vegetais? O que sabem de geografia humana, sociologia ou de psicologia? E estão lá tratando com índios e quilombolas. Pior, médicos não estudam gente, só máquina. Seres humanos são a mistura de pensares, sentires, quereres. Enquanto não afetarmos nossos profissionais inteiros, no triângulo básico quereres, pensares e sentires, não nos enxergaremos no “outro”. Como podemos sair de São Paulo para trabalhar no Maranhão ou na África e entendermos essas populações que vivem no limite da idade média? Consideramos essas pessoas como iguais, realmente? Nem com as comunidades ao lado de nossas casas muitas vezes colocamos atenção e amorosidade.
A empresa contrata um diretor de sustentabilidade, outro diretor de meio ambiente, outro para dirigir o instituto e a fundação, outro para cuidar do relacionamento com comunidades, outro para cuidar da comunicação com colaboradores e outro ainda para desenvolver os colaboradores. Eles quase nunca conseguem trabalhar sistemicamente. O entendimento do conceito de sustentabilidade se perde nos cargos e egos. Onde está a área de sustentabilidade nas empresas? Como ter uma área para um conceito que envolve tudo? Um diretor de Sustentabilidade que não consegue falar com o diretor Financeiro? Egos e pouca compreensão do conceito atrapalham o caminho.
Temos desafios diversos para construir as empresas do futuro e todos eles passam pelas lideranças. São os gestores que podem transformar as empresas, as ONGS e o governo. São os empreendedores de si mesmo e que por isso serão capazes de empreender os novos tempos. Multiplicam-se na sociedade civil os interlocutores do futuro, eles estarão pressionando para que mudanças efetivas ocorram na próxima década. Precisamos de novos líderes que acordem colaboradores nas nossas organizações. As universidades não conseguem formá-los na proporção da necessidade. Muitas empresas investem na educação de seus colaboradores para compensar a ausência de profissionais capacitados. Faltam soldadores e até pedreiros em algumas regiões. Lutamos contra o analfabetismo quando a tecnologia invade todos os processos, e temos ainda o maior desafio: alfabetizar para o futuro, para o mundo que estamos gerando.
O desafio do líder gestor hoje é conseguir ter uma visão sistêmica, que seja capaz de se reeducar e educar seu colaborador em justiça social, cidadania e profundo respeito pela natureza. Sabemos fazer crescimento, estamos longe de saber fazer desenvolvimento sustentável. Numa praça no interior do Maranhão, onde muitas empresas estão investindo, sentei numa cadeira em volta de uma árvore, ao lado de um típico maranhense. Alguém comentou que eu já voltava para o Rio no dia seguinte quando ele comentou: “Por que todo mundo que é legal, boa gente, vai embora?” E eu rapidamente disse: Ué, como você sabe que eu sou legal? “Ah! Porque a senhora olhou para mim. Todo mundo que chega aqui, só reclama, parece que não sabem que vieram para o estado mais pobre do Brasil. Reclamam de tudo, da estrada, da comida, da nossa falta de educação. É tudo verdade, mas a gente não gosta que fiquem falando, falando… Porque não ajudam a gente? Por que olham para a gente como olham?”
Fui embora pensando numa palavra que as empresas não falam e que poderá fazer toda a diferença para o nosso futuro: amor. Comecei com um pouco de história, não por acaso. É muito importante perceber o que conseguimos andar em vinte anos. Tenho hoje o prazer de conhecer alguns gestores que perderam o medo de amar gente, natureza, tudo que tem vida. Gerente que é capaz de sentar ao lado de colaboradores para assistir uma aula de responsabilidade social. Engenheiros que tem idéias incríveis de projetos sociais, para diminuir o impacto de seu negócio. Diretores que são capazes de planejar e gerir não só números, mas colaboradores e comunidades. São poucos ainda, mas existem. Perceberam que o nosso planeta pulsa, respira, é vivo. Tentam aprender todo dia a equilibrar seus egos, conseguem estimular parcerias, enfrentam a dificuldade diária da convivência nas grandes corporações com paciência. Sabem, como eu, que não sabemos nada, porque nesse momento precisamos fazer coisas que nunca fizemos. Esses gestores, embriões dos gestores do século XXI, me fazem trabalhar cada vez com mais amor.

 de: http://www.mundosustentavel.com.br/2012/01/o-gestor-sustentavel-do-seculo-xxi/
Postado por Daniela Kussama

Sobre Territórios Criativos


  No Brasil: Para a Secretaria Nacional de Economia Criativa do Ministério da Cultura

Há dois tipos de territórios criativos: as bacias criativas e as cidades criativas. A institucionalização de bacias criativas se refere ao reconhecimento pelo Ministério da Cultura (MinC) e à criação de um sistema de governança compartilhada entre o poder público e a sociedade civil, as chamadas “bacias criativas”. Essas consistem em regiões geográficas formadas por diversos territórios com identidade cultural convergente, que representem cidades e pólos criativos regionais.

Nesses pólos coexiste um grande número de atividades que vão das indústrias culturais clássicas (como a do cinema, a da música e a editorial), a setores como propaganda, arquitetura, o mercado de artes e antiguidades, artesanato, design, moda, vídeo, softwares de lazer interativo, artes cênicas, softwares e jogos de computador, televisão e rádio, e ainda, as “indústrias criativas” que, regra geral, são definidas como aquelas que utilizam insumos criativos e geram propriedade intelectual.

As cidades criativas, por sua vez, se referem a um complexo urbano onde as atividades culturais de vários tipos são parte integrante da dinâmica local. Será uma chancela concedida pelo MinC às cidades brasileiras que apresentarem candidatura em alguma área temática (música, cinema, teatro etc.) e atenderem a um conjunto de parâmetros e requisitos. Compreende também uma rede virtual de interlocução e integração das referidas cidades chanceladas.

Situação atual

A política de institucionalização de territórios criativos está em processo de desenvolvimento na Secretaria da Economia da Cultura/MinC.


No reino Unido: A criação de bairros e quarteirões culturais como política urbana

O Reino Unido é, provavelmente, a nível internacional, o melhor exemplo de uma aposta assumida na adopção de estratégias de regeneração e desenvolvimento das cidades através das indústrias criativas, tendo o próprio conceito sido originalmente desenvolvido pelo Department of Culture, Media and Sports (UK DCMS). Neste país, as indústrias criativas criam cerca de 1.9 milhões de postos de trabalho em 121 000 empreendimentos e gerando 8% do valor nacional bruto.

Grandes cidades industriais como Glasgow, Manchester, Liverpool ou Sheffield responderam à estagnação pós-industrial com processos de regeneração do seu tecido económico e social através das indústrias criativas, das actividades culturais e das artes e, na maior parte dos casos, partindo da criação de quarteirões e bairros culturais e criativos. Nomeadamente, a cidade de Sheffield desenvolveu o conceito e projecto Cultural Industries Quarter, que viria a renovar totalmente a sua imagem, projectando-a para a linha da frente deste conceito de gestão de cidades.

O Cultural Industries Quarter (CIQ) é uma área de 30 hectares no centro da cidade de Sheffield, e constitui o maior e mais concentrado cluster de produção criativa na região. Sobre o fundamento conceptual da Inovação e Design, inicia em 1980 um processo de regeneração cultural, cuja missão se baseava na combinação de criação de emprego, coesão social, consumo cultural e novas tecnologias. Em 1997, esta área contava 150 empresas culturais, incluindo estúdios discográficos, cinema, software, design, audiovisual e empresas de impressão e tipografia. Este projecto teve um rápido crescimento inicial, cujo ritmo continua hoje a criar oportunidades para mais inovação e intervenção.

A produção musical tem sido um fortíssimo agente na projecção nacional e internacional de Sheffield e da região de Yorkshire. Nos anos 70, David Bowie, gravou Ziggy Stardust, que viria a ser mundialmente reconhecido. Na década seguinte, Yorkshire viveu uma cena post-punk muito forte de onde surgiram igualmente êxitos musicais mundiais incluindo The Sisters of Mercy, The Cult, Gang of Four, Human League, e The Mission. Em 1995, surgem os Pulp com o êxito massivo Common People, uma música que retrata exactamente a vida da «classe trabalhadora» do norte. Mais recentemente, a cena musical de Yorkshire volta a estar no mercado discográfico internacional com trabalhos indie-rock como os Kaiser Chiefs ou Arctic Monkeys.

É, no entanto, importante realçar que apesar da intervenção assumida do poder politico, através do UK DCMS, incentivando esta orientação de gestão nas cidades, nem sempre as Cidades Criativas emergentes no Reino Unido partiram dessa iniciativa institucional e politica. Na verdade, a essência destes casos partiu muitas vezes da criatividade individual, nos movimentos independentes, (ou em parcerias público-privadas revestidas de algum carácter informal (4) que de alguma forma sempre tinham existido nessas cidades, ainda que de uma forma marginal, underground.

Norte de Portugal: «A Manchester Portuguesa» e «o Soho do Porto»

O norte de Portugal e, em particular, o Porto convive com uma dualidade de imagens e identidades que facilmente lhe são associadas: uma imagem tradicional e conservadora e, por outro lado, uma imagem de vanguarda e inovação.

É, de certa forma, curioso lembrar aqui a metáfora do Porto como «cidade do trabalho» e, ainda mais, a «Manchester portuguesa». De facto, um dos traços identitários mais fortes do Porto e da região norte em geral, é a sua imagem tradicional, a ideia histórica da sua orientação para o trabalho a par da concentração de indústria. Mas, se pensarmos na evolução de Manchester, e na mudança da sua identidade nos últimos anos, talvez seja possível continuar a encontrar semelhanças com o caso do Porto: uma cidade com um carácter industrial, onde floresce uma classe criativa, crí­tica, consciente e interventiva (5). Em confronto com a imagem tradicional, é hoje evidente uma imagem de inovação, modernidade e vanguarda através de algumas instituições culturais com visibilidade internacional (como a Casa da Música e a Fundação de Serralves), festivais, actividades culturais, associações, e alguns «micro-clusters» criativos que facilmente se reconhecem em alguns pontos da cidade. A maior parte deles são projectos e entidades privadas que demonstram uma espécie de clusterização já em curso, essencialmente estruturada no empreendedorismo privado, e decorrente da tendência cultural pós-Capital 2001.

Muito para além desta evidência, e remetendo para os dados concluídos pelo referido Estudo Macroeconómico, de facto, a região norte demonstra ter, neste momento, cenários de oportunidade para que a regeneração urbana e as indústrias criativas se desenvolvam como realidades convergentes para uma imagem de marca da região. Não obstante os principais activos e recursos criativos se encontrarem concentrados na área metropolitana do Porto, também Braga e Guimarões possuem actores e dinâmicas criativos já fortemente implantados neste sector, pelo que também estas cidades são hoje conhecidas pela sua actividade universitária e cultural e são potenciadoras de uma imagem criativa, de inovação e modernidade.
Após um longo e intenso trabalho no terreno, o Estudo Macroeconómico em questão identificou cinco oportunidades chave para o estabelecimento de um cluster criativo sustentável, distintivo e vibrante no norte de Portugal: boa infra-estrutura criativa e cultural, negócios criativos, organizações e processos estão a estabelecer-se em áreas centrais e a organizar-se em redes, espaço público de qualidade e renovado, regeneração orientada para as funções culturais e criativas, uma mistura de produção e consumos criativos de classe mundial e um património histórico de valor universal. A estas oportunidades acresce ainda o acesso a financiamento específico.

Além destas oportunidades, o Estudo constata também uma distribuição sectorial no actual panorama criativo da região em que, a Arte e a Música são os sectores mais representados, seguidos do Design de Moda e do Design, sendo considerados os sectores com maior potencial de desenvolvimento, particularmente o da Música.

Como estruturar e projectar então a identidade deste território criativo? Voltando ao genius locci de Landry, a construção do lugar com base em projectos colaborativos e interactivos através da cultura, transforma-se no elemento estratégico de desenvolvimento da dinâmica e da identidade da cidade.

O potencial de comunicação e projecção dos projectos criativos existentes actualmente dispersa-se, pelo facto de cada um deles existir isoladamente, conseguindo apenas uma visibilidade local. A atractividade cultural, criativa e turística da região devem ser promovidas como um todo (6) e, as oportunidades anteriormente elencadas, interligadas, contribuirão para o desenvolvimento de uma «marca criativa» regional com dimensão e capacidade competitiva: a NCriativo.

Marca e marketing – o vector estratégico na afirmação do território criativo 

Entre outras características, os negócios criativos estão entre os sectores mais dinâmicos, flexíveis e inovadores, influenciando a procurara de novos métodos de comunicação, além de que os valores culturais e empresariais destes negócios têm um impacto directo no reforço da identidade territorial.

Relativamente à afirmação do cluster criativo enquanto marca e identidade do território, o plano de acção associado a este Estudo Macroeconómico define várias estratégias e campanhas a realizar no sentido da sua comunicação e promoção, sendo de destacar, de uma forma generalizada: 1. Estruturação e promoção da Marca NCriativo enquanto conceito umbrella; 2. Divulgação e promoção dos empreendedores e dos talentos criativos da região; 3. Associação à Capital Europeia da Cultura – Guimarões 2012 (7).

Relativamente à primeira, uma marca forte é um instrumento de agregação de projectos que, sob uma mesma designação, podem influenciar o mercado de forma eficaz. Simultaneamente, funciona como factor de valorização comercial e de reforço da imagem de todos os que se acolherem sob a sua alçada. Importa por isso, numa primeira fase, concertar e estruturar os elementos da marca (NCriativo): imagem, valores, posicionamento estratégico, logótipo, mercados-alvo, etc. A segunda vertente pretenderá aumentar a notoriedade e melhorar a imagem das indústrias criativas no território (ou mesmo, para além dele) (8) e, numa segunda fase, junto de potenciais clientes internacionais. Campanhas de publicidade, comunicação online (designadamente o website, a divulgação por email, as newsletters digitais), realização de eventos e/ou participação em eventos internacionais, acções de relações públicas e assessorial de imprensa (com os media regionais, nacionais, especializados e internacionais), todos a actuar numa base de regularidade. Fundamento para o terceito ponto: Guimarães 2012 – Capital Europeia da Cultura constitui uma oportunidade ímpar para o futuro da Economia Criativa da Região Norte. A oportunidade para o desenvolvimento de redes e parcerias e a promoção do capital criativo regional, será preponderante no desenvolvimento da «marca criativa» regional, que poderá passar a ser visível na vida criativa e cultural da região, desde que o seu envolvimento seja efectivo, transversal e tenha escala regional. (9)

Tendo em conta a experiência da Porto 2001, poder-se-á considerar que a região norte têm agora uma segunda oportunidade para se projectar na região, no país e até na Europa, mas também, perceber que o grande desafio virá posteriormente. Ou seja, garantir que após este evento, a tendência não esmoreça num «efeito fim de festa», como aconteceu em 2001.

No seguimento destas ideias, parecem haver dois conceitos fundamentais ao desenvolvimento de uma identidade criativa para a região norte: um duplo sentido de Tempo (para a criação de toda a estrutura, para o funcionamento das redes começar a dar frutos e por outro lado, no prolongamento das estratégias e das dinâmicas após 2012) e Transversalidade (trabalhar em rede, em parceria, e entre vários sectores). Seria quase de sugerir a adaptação do modelo de Richard Florida, neste caso, para 5 T’s.

Subjacente a toda a estratégia de implementação da marca, assim como de outras linhas de acção, encontramos um denominador comum: a constituição de uma Agência para o Desenvolvimento Criativo, que é apontada como parceira para as acções de comunicação descritas. Esta Agência encontra a sua referência benchmarking na agência britânica CIDA East London, reconhecida como um exemplo internacional de sucesso.

As funções atribuídas a esta instituição são várias, nomeadamente a promoção da marca (que neste Estudo surge, curiosamente, elencada em último lugar): produção de conhecimento sobre o tema, promover a clusterização e a transversalidade, estabelecer parcerias e redes, desenvolver o mercado, etc. É interessante, no entanto, confrontar as funções previstas para esta Agência com o exemplo do micro-cluster da Rua Miguel Bombarda. Este pequeno «Soho do Porto» exemplifica, à sua escala, que a possibilidade de trabalhar criativamente e que a criação de um ambiente e uma identidade, não só é possí­vel, como não exige injecção de capital público, intervenção politica, ou qualquer tipo de regulamentação imposta. Pelo contrário.
O próprio Tom Fleming, outro guru desta “recente” problemática e, consultor para este projecto, salientou, aquando de uma intervenção no Porto, o desenvolvimento criativo premeditadamente pouco regulado, resultando em projectos vivos e espontâneos. Na mesma intervenção defendeu, ainda, a bem de toda a teoria subjacente, que as cidades devem, antes de tudo, procurar e reconhecer o potencial criativo e o talento das suas pessoas. Uma ideia também defendida por Florida: Who’s your city? 

Voltando ao Reino Unido, Liverpool, que tem vindo a desenvolver uma imagem no sentido de Cidade Criativa, consegue, este ano, uma maior visibilidade ao ser Capital Europeia da Cultura. Um dos pilares da sua programação cultural é uma forte relação com a comunidade, desenvolvendo projectos locais. Este tem sido um ponto forte na sua estratégia de comunicação, juntamente com a promoção da descoberta da região.
De que precisa, afinal, uma cidade ou região para ser criativa e se afirmar como tal? Conhecer e incentivar o potencial das pessoas, mantendo os valores de uma ética criativa mas igualmente criar uma estrutura de organização e administração com capacidade de gestão e de liderança.

Alguém definiu que um processo de branding deve ser construído como quem constrói uma narrativa. Acrescentaríamos que a narrativa deve estar em consonância com a realidade, e sem atropelos ou ambiguidades com outros conceitos de comunicação pretendidas para a região.
Marta Margarida Correia