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segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Três de mim




(Ilustração emprestada de Multiverso, livro de Leonardo Pratignani)

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As coxas grossas a poucos centímetros das minhas mãos, de cima para baixo me “scaneava” a alma pelos olhos, e sorria. A boca, portal vermelho para a felicidade. A voz, nem precisou usar. Sua expressão era convite. Aceito! E tudo começou assim. Acordávamos juntos."Breakfast", e seguíamos em par para os trabalhos cotidianos. Uma rotina agradável e nada tediosa.  Já se iam vinte mil anos assim. Nossa casa de arquitetura antiga com bonitos jardins, na beira de um lago, contava com todos os confortos e modernidades necessárias para situar-se entre o bucólico e o funcional.  Companheiros. Uma cumplicidade impensada para os padrões daquela outra realidade de onde você neste momento lê este escrito. Sim, as vidas se bifurcam em realidades muitas. E estamos aqui.
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Fecho os olhos, esvazio a mente, são três horas e vinte e dois minutos de uma madrugada Juliana do ano de 20035. Os humanoides, de uma constelação qualquer, fazem festa no posto 30 do outro lado da minha rua suspensa. Eu não gosto das suas robôs sexi que imitam as antigas prostitutas humanas de rua. Eles têm armas, e naves compactas sucateadas que estacionam umas sobre as outras. Bebem algum tipo de mistura que junta álcool etílico e poeira de cometas. Eles são gordos, têm cheiro dos combustíveis fósseis do passado, embora as suas naves sejam movidas à energia estelar. Hoje é uma daquelas noites solares na antiga terra em que sinto falta das minhas pílulas de vinho tinto e fumo maços de uma mistura semi-orgânica que comprei de um viajante intergalático que falava um pouco de “terraquiam” (é assim que eles chamam o nosso idioma naquele quadrante do universo). Sinto-me tonto, irritado, com saudades de Edja e dos seus seios volumosos e macios. Estou acordado há três ciclos cósmicos e ainda não encontrei nem um terço dos produtos que preciso comprar. Pra piorar, o dinheiro “vanuziano” que ganhei nos jogos noturnos da terra nova, está para acabar.
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Uma e meia da manhã. Escrevo frases desconexas e o meu pensamento se difunde em buscas ininterruptas de soluções difíceis para problemas sérios demais. Sinto-me pouco. Mas, sei dos meus dons. O século é o vigésimo primeiro da era cristã. Sim, eu estou no Ocidente. Vivendo em um país chamado Brasil. Neste universo, todos envelhecem junto com o passar do tempo, os amores não dizem muito para uma sociedade monetizada demais. Por mais que eu busque, não consigo me encontrar em nada por aqui. Parece que estou novamente deslocado no espaço-tempo. Isto mesmo, nesta realidade tudo está limitado nestes dois campos. Tenho sentido saudade de coisas que aparentemente eu nunca vivi. Certamente são interseções deste com os outros universos onde existo. Aqui não se dispõe de tecnologias e nenhum outro meio para realizar interações deste tipo. Tudo aparece para mim como elementos psíquicos e são facilmente confundidos com ilusões e ou delírios por qualquer cidadão deste tempo e lugar. Mas, nem tudo é angústia, tenho vivido experiências interessantes e aprendido bastante com esta dimensão tão limitada. O que há de mais estimulante são as mulheres deste tempo- lugar.


DJ de S.