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segunda-feira, 20 de maio de 2013

O Cavalo do Tempo


Quando eu coloquei rédeas no tempo e aprendi a cavalga-lo. Vi que o que passava lentamente ao lado, não era a paisagem natural, mas sim, a cultura humana transfigurada em afetos, relações, encontros e desencontros. Percebi também que não se acomoda o tempo no estábulo da vida. Ele não para de galopar! A questão é se o mantemos como montaria, ou não.

Don Johnson de Sales.


Uma vida examinada




Suas últimas palavras foram dedicadas ao desprendimento para com todos os bens materiais que agora seriam divididos entre os seus familiares. O "espólio" menor de uma vida vivida na altura do mais platônico dos banquetes. Lembrava cada coloração capilar que gruadara-se em seu suor durante todas essas décadas. Cada música, letra e melodia; cada sabor: Amargo, adocicado, agridoce, estranho ou peculiar de toda aquela extensa vivência etílico-social passada em tavernas, botecos e quartos de hotéis suspeitos. Vivera muito e da forma que desejara. Não tinha porque lamentar o destino que o jogara numa cama acometido de cirrose hepática e de uma pneumonia chata e fatal. Tudo isso, essa sorte, demasiadamente severa, às vistas dos outros, representava para ele, o pequeno e suave preço a pagar pela vida de gozo e plenitude da qual pudera desfrutar.

Viver é uma arte multifacetada e complementar à nobre arte de falecer. Essa havia sido uma das principais "filosofias" que norteara toda a sua existência. E talvez por isso mesmo, desempenhara nos seus últimos instantes entre nós, o papel elucidativo a cerca de sua dócil e resignada passagem.

E quanto a mim, homem feito, caminhando para a meia-idade entre incertezas, inseguranças e determinadas covardias menores. Me vi mexido, balançado pela integridade meta-moral daquela vida plena que se estendeu por tantos recantos desse mundo e praticamente passou despercebida devido a nossa desatenção para com às existências filosóficas e tão bem auto-examinadas, de seres especiais como meu bisavô.

Mas, surpreendentemente, não me passou pela cabeça fazer comparações geracionais e ou perguntas vulgares do tipo: Será que ainda se fazem homens assim? De certo, eu intuia que sim.

E isto me fez compreender melhor o que o filosofo Sócrates ensinou ao dizer que "Uma vida não examinada nao merece ser vivida". Neste caso, em especial, o merecimento foi total.


Don Johnson de Sales.


Dois olhos azuis


Um par de olhos azuis mira o futuro. Como se o monitor do PC fosse um oráculo moderno. Na cabeça, técnicas e conceitos. No dia, um conjunto elaborado de práticas profissionais. O frio europeu já havia acolhido tais curvas e relevos de pele branca em dias de estudo e aperfeiçoamento intelectual. lábios hipnotizantes emolduram um sorriso que trazem as mais inquietantes fantasias masculinas à tona. Mas seu ideal passa longe do lugar comum de "objeto do desejo". Quer a expertise como estandarte e os poderes sensuais como economia do seu ser mágico que apenas a compartilha com espíritos compatíveis e merecedores. Essas mulheres intelectualizadas, poliglotas, artífices da praxis e academicamente poderosas, sempre me encantam. A mim, e a milhões de homens e mulheres por todo o planeta. Nelas, a sensualidade emana de forma difusa, entrelaçada sobre corpo e intelecto, desafiando nossos sentidos, instintos e desejos que se revezam entre o egoísmo do querer para si e a generosidade de propagandear para o mundo tal maravilha. 

Esse facínio certamente tomou conta de Don Dellilo e o levou a falar através de seu personagem Murray no primeiro capítulo do romance "Ruido Branco" sobre as situações e as gentes "cheias de lábia sexual". Murray, afirmava fugir dessas "situações" e ao discorrer sobre o assunto, declarava: 

"A ironia da coisa é que eu adoro mulher. Fico doido quando vejo umas pernas compridas, andando depressa, com passos largos, quando vem uma brisa do rio, numa manhã luminosa de dia de semana. A segunda ironia é que não é tanto o corpo da mulher que eu desejo, é  a mente. A mente da mulher. Aqueles compartimentos delicados, aquele fluxo unidirecional caudaloso, como uma experiência de física. Como é gostoso conversar com uma mulher inteligente de meias, de pernas cruzadas! Aquele chiadinho de náilon me proporciona uma felicidade de vários níveis".

Eu entendo Murray! Sei exatamente do que ele está falando. Conheço empiricamente esses instantes de felicidade em vários níveis, tal como ele descreve. Acrescento todavia que em certas mulheres, não dá jamais para organizar em hierarquia os prazeres imanentes do seu corpo ou da sua mente. Esses prazers encontram-se fundidos formando um conjunto que conduz a um tipo especial de nirvana justamente por suas qualidades indissolúveis.

Talvez pelo torpor causado pela simples possibilidade de tal estado, não tenha sido ainda possivel precisar se aquele par de olhos mirando o futuro, são realmente azuis, verdes, ou se estão graciosamente coloridos por alguma combinação de tons entre o celeste e o esmeralda.  

Don Johnson de Sales.