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quinta-feira, 18 de abril de 2013

Valores Universais Existem?





Certa vez, me vi às voltas com um debate envolvendo a existência, ou não, de valores universais próprios da humanidade em qualquer que sejam as civilizações. Tal esforço intelectual de tão presunçosa (ou desavisada) envergadura se dava entre participantes de uma rede social que congregava intelectuais vinculados à vida acadêmica. Na ocasião, eu defendia que a preservação da vida humana seria um valor “universal”. E fui prontamente questionado por um colega, que ao que me pareceu gostaria de me ver apontar as bases conceituais ou científicas de tal afirmação. Na ocasião, pelo que me lembro, desviei das bases teóricas acadêmicas e afirmei que a academia não dá conta da totalidade das questões culturais ou sociais humanas e que buscar unicamente nela respostas para tais questões seriam limitações academicistas. Mas no entanto, não apresentei maiores considerações sobre minha visão. A despeito do resultado ou consequências do referido episódio, esta questão ganhou em meu pensamento, relexões e autocrítica um lugar de relevância.


Ruth Benedict em “Padrões de Cultura” (Ed. Livros do Brasil, Lisboa) escreve:


Podíamos supor que na questão de privar alguém da vida todos os povos concordariam na sua condenação. Ao contrário, na questão de homicídio pode afirmar-se que ele não é censurável, se se romperam as relações diplomáticas entre dois povos vizinhos, ou que é costume matar os primeiros dois filhos, ou que o marido tem o direito de vida ou de morte, ou que é dever do filho matar os pais antes de serem velhos. Pode suceder que se mate o que rouba uma galinha, ou aquele a quem nasçam primeiro os dentes superiores, ou que nasça numa quarta-feira. Entre certos povos sofrem-se tormentos por se ter causado acidentalmente uma morte; entre outros o facto é coisa sem importância. O suicídio pode também ser uma questão fútil, o recurso de alguém que tenha sofrido qualquer leve censura, um acto que é frequente numa tribo. Pode ser o acto mais elevado e nobre que um homem pode cometer. Mas pode suceder que só a própria referência a ele seja motivo da mais incrédula chacota. E propriamente o acto em si ser inconcebível como coisa possível. Porém, ser um crime punível por lei, ou considerado como pecado contra os deuses.


Ruth Benedict aborda, em relação ao conjunto do texto originário, tais questões sobre a “lente” da integração e relativização das culturas e busca situar tais práticas num universo de costumes e padrões comportamentais que se apresentam como “feições culturais” distintas e possíveis entre as diversas civilizações.


Diante de tal argumentação, me vejo impelido a refletir sobre a origem histórica, social e política de cada comportamento, padrão ou feição cultural identificada em cada dada civilização na qual eles encontram-se “naturalizados”.


Eu sei, é um longo e complexo debate que não tenho a pretensão de aprofundar aqui. Mas deixo o questionamento: No caso dos exemplos apresentados pela autora, não haveria a possibilidade do “valor” preservação da vida humana encontrar-se subjugado por tradições e comportamentos histórica e socialmente forjados? Trato a “preservação da vida humana” como “valor” devido a sua aparente relação de proximidade com a sobrevivência biológica das espécies. E como “universal”, devido à universalidade do ser humano. Mas confesso que não tenho no momento a condição de definir se esse “valor” seria aplicável tanto ao indivíduo, que despido das construções culturais de sua civilização e de sua época, se visse diante da possibilidade de erradicação de sua vida, ou se é possível fazer tais especulações em relação a uma civilização. Também, por esse raciocínio, valor e instinto não seriam cofundidos e sobrepostos? Sem falar que o próprio conceito (ou conceitos) de "valor" precisa ser trabalhado. Enfim, os estudos, reflexões e debates continuam...