Faço um apelo aos governos brasileiro, equatoriano, venezuelano e
argentino para que abandonem o projeto da reforma da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). E o apelo é especialmente
dirigido ao Brasil dada a influência que tem na região. (Boaventura de Sousa Santos)
Quem
poderia imaginar há uns anos que partidos e governos considerados
progressistas ou de esquerda abandonassem a defesa dos mais básicos
direitos humanos, por exemplo, o direito à vida, ao trabalho e à
liberdade de expressão e de associação, em nome dos imperativos do
“desenvolvimento”? Acaso não foi por via da defesa desses direitos que
granjearam o apoio popular e chegaram ao poder? Que se passa para que o
poder, uma vez conquistado, se vire tão fácil e violentamente contra
quem lutou para que ele fosse poder? Por que razão, sendo um poder das
maiorias mais pobres, é exercido em favor das minorias mais ricas?
Porque é que, neste domínio, é cada vez mais difícil distinguir entre os
países do Norte e os países do Sul?
Os fatos
Nos
últimos anos, os partidos socialistas de vários países europeus
(Grécia, Portugal e Espanha) mostraram que podiam zelar tão bem pelos
interesses dos credores e especuladores internacionais quanto qualquer
partido de direita, não parecendo nada anormal que os direitos dos
trabalhadores fossem expostos às cotações das bolsas de valores e,
portanto, devorados por elas. Na África do Sul, a polícia ao serviço do
governo do ANC, que lutou contra o apartheid em nome das maiorias
negras, mata 34 mineiros em greve para defender os interesses de uma
empresa mineira inglesa. Bem perto, em Moçambique, o governo da Frelimo,
que conduziu a luta contra o colonialismo português, atrai o
investimento das empresas extrativistas com a isenção de impostos e a
oferta da docilidade (a bem ou a mal) das populações que estão sendo
afetadas pela mineração a céu aberto.
Na India, o governo do
partido do Congresso, que lutou contra o colonialismo inglês, faz
concessões de terras a empresas nacionais e estrangeiras e ordena a
expulsão de milhares e milhares de camponeses pobres, destruindo os seus
meios de subsistência e provocando um enfrentamento armado. Na Bolívia,
o governo de Evo Morales, um indígena levado ao poder pelo movimento
indígena, impõe, sem consulta prévia e com uma sucessão rocambolesca de
medidas e contra-medidas, a construção de uma auto-estrada em território
indígena (Parque Nacional TIPNIS) para escoar recursos naturais. No
Equador, o governo de Rafael Correa, que corajosamente concede asilo
político a Julian Assange, acaba de ser condenado pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos por não ter garantido os direitos do
povo indígena Sarayaku em luta contra a exploração de petróleo nos seus
territórios. E já em maio de 2003 a Comissão tinha solicitado ao Equador
medidas cautelares a favor do povo Sarayaku que não foram atendidas.
Em
2011, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) solicita ao
Brasil, mediante uma medida cautelar, que suspenda imediatamente a
construção da barragem de Belo Monte (que, quando pronta será a terceira
maior do mundo) até que sejam adequadamente consultados os povos
indígenas por ela afetados. O Brasil protesta contra a decisão, retira o
seu embaixador na Organização dos Estados Americanos (OEA), suspende o
pagamento da sua cota anual à OEA, retira o seu candidato à CIDH e toma a
iniciativa de criar um grupo de trabalho para propor a reforma da CIDH
no sentido de diminuir os seus poderes de questionar os governos sobre
violações de direitos humanos. Curiosamente, a suspensão da construção
da barragem acaba agora de ser decretada pelo Tribunal Regional Federal
da 1ª Região (Brasília) com base na falta de estudos de impacto
ambiental.
Os riscos
Para responder às
questões com que comecei esta crônica vejamos o que há de comum entre
todos estes casos. Todas as violações de direitos humanos estão
relacionadas com o neoliberalismo, a versão mais anti-social do
capitalismo nos últimos cinquenta anos. No Norte, o neoliberalismo impõe
a austeridade às grandes maiorias e o resgate dos banqueiros,
substituindo a protecção social dos cidadãos pela protecção social do
capital financeiro. No Sul, o neoliberalismo impõe a sua avidez pelos
recursos naturais, sejam eles os minérios, o petróleo, o gás natural, a
água ou a agro-indústria. Os territórios passam a ser terra e as
populações que nelas habitam, obstáculos ao desenvolvimento que é
necessário remover quanto mais rápido melhor.
Para o capitalismo
extrativista a única regulação verdadeiramente aceitável é a
auto-regulação, a qual inclui, quase sempre, a auto-regulação da
corrupção dos governos. As Honduras oferecem neste momento um dos mais
extremos exemplos de auto-regulação da atividade mineira onde tudo se
passa entre a Fundação Hondurenha de Responsabilidade Social Empresarial
(FUNDAHRSE) e a embaixada do Canadá. Sim, o Canadá que há vinte anos
parecia ser uma força benévola nas relações internacionais e hoje é um
dos mais agressivos promotores do imperialismo mineiro.
Quando a
democracia concluir que não é compatível com este tipo de capitalismo e
decidir resistir-lhe, pode ser demasiado tarde. É que, entretanto, pode o
capitalismo ter já concluído que a democracia não é compatível com ele.
O que fazer?
Ao
contrário do que pretende o neoliberalismo, o mundo só é o que é porque
nós queremos. Pode ser de outra maneira se a tal nos propusermos. A
situação é de tal modo grave que é necessário tomar medidas urgentes
mesmo que sejam pequenos passos. Essas medidas variam de país para país e
de continente para continente ainda que a articulação entre elas,
quando possível, seja indispensável. No continente americano a medida
mais urgente é travar o passo à reforma da CIDH em curso. Nessa reforma
estão particularmente ativos três países com quem sou solidário em
múltiplos aspectos de seu governo, o Brasil, o Equador, a Venezuela e a
Argentina. Mas no caso da reforma da CIDH estou firmemente ao lado dos
que lutam contra a iniciativa destes governos e pela manutenção do
estatuto actual da CIDH. Não deixa de ser irônico que os governos de
direita, que mais hostilizam o sistema interamericano de direitos
humanos, como é o caso da Colômbia, assistam deleitados ao serviço que
os governos progressistas objectivamente lhes estão a prestar.
O
meu primeiro apelo é aos governos brasileiro, equatoriano, venezuelano e
argentino para que abandonem o projeto da reforma. E o apelo é
especialmente dirigido ao Brasil dada a influência que tem na região. Se
tiverem uma visão política de longo prazo, não lhes será difícil
concluir que serão eles e as forças sociais que os têm apoiado quem, no
futuro, mais pode vir a beneficiar do prestígio e da eficácia do sistema
interamericano de direitos humanos. Aliás, a Argentina deve à CIDH e à
Corte a doutrina que permitiu levar à justiça os crimes de violação dos
direitos humanos cometidos pela ditadura, o que muito acertadamente se
converteu numa bandeira dos governos Kirchner na política dos direitos
humanos.
Mas porque a cegueira do curto prazo pode prevalecer,
apelo também a todos os ativistas de direitos humanos do continente e a
todos os movimentos e organizações sociais - que viram no Fórum Social
Mundial e na luta continental contra a ALCA a força da esperança
organizada - que se juntem na luta contra a reforma da CIDH em curso.
Sabemos que o sistema interamericano de direitos humanos está longe de
ser perfeito, quanto mais não seja porque os dois países mais poderosos
da região nem sequer subscreveram a Convenção Americana de Direitos
Humanos (EUA e Canadá), Também sabemos que, no passado, tanto a Comissão
como a Corte revelaram debilidades e seletividades politicamente
enviesadas. Mas também sabemos que o sistema e as suas instituições têm
vindo a fortalecer-se, atuando com mais independência e ganhando
prestígio através da eficácia com que têm condenado muitas violações de
direitos humanos.
Desde os anos de 1970 e 1980, em que a Comissão
levou a cabo missões em países como o Chile, a Argentina e a Guatemala e
publicou relatórios denunciando as violações cometidas pelas ditaduras
militares, até às missões e denúncias depois do golpe de estado das
Honduras em 2009; para não falar nas reiteradas solicitações para o
encerramento do centro de detenção de Guantanamo. Por sua vez, a recente
decisão da Corte no caso “Povo Indígena Kichwa de Sarayaku versus
Equador”, de 27 de Julho passado, é um marco histórico de direito
internacional, não só a nível do continente, como a nível mundial. Tal
como a sentença “Atala Riffo y niñas versus Chile” envolvendo a
discriminação em razão da orientação sexual. E como esquecer a
intervenção da CIDH sobre a violência doméstica no Brasil que conduziu à
promulgação da Lei Maria da Penha?
Os dados estão lançados. À
revelia da CIDH e com fortes limitações na participação das organizações
de direitos humanos, o Conselho Permanente da OEA prepara um conjunto
de recomendações para serem apresentadas para aprovação na Assembleia
Geral Extraordinária, o mais tardar até Março de 2013 (até 30 de
Setembro, os Estados apresentarão as suas propostas). Do que se sabe,
todas as recomendações vão no sentido de limitar o poder da CIDH para
interpelar os Estados em matéria de violação de direitos humanos. Por
exemplo: dedicar mais recursos à promoção dos direitos humanos e menos à
investigação de violações; encurtar de tal modo os prazos de
investigação que tornam impossível uma análise cuidada; eliminar do
relatório anual a referência a países cuja situação dos direitos humanos
merece atenção especial; limitar a emissão e extensão de medidas
cautelares; acabar com o relatório anual sobre a liberdade de expressão;
impedir pronunciamentos sobre violações que pairam como ameaças mas
ainda não foram concretizadas.
Cabe agora aos ativistas de
direitos humanos e a todos os cidadãos preocupados com o futuro da
democracia no continente travar este processo.
Por:
Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).
Fonte: Carta Maior
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segunda-feira, 7 de janeiro de 2013
Estudante é premiada por trabalho que cria índice de desigualdade de gênero para o Brasil
Mulheres e homens têm acesso praticamente igual à educação no Brasil,
mas quando se fala em política e economia, os homens têm vantagem
considerável. Eles estão em cerca de 54,4 milhões de posições no mercado
de trabalho, enquanto elas ocupam 43 milhões. O peso também está no
orçamento do final do mês: na média, os homens ganham R$ 4,9 por hora a
mais que as mulheres em cargos semelhantes. Na política, são 2.013
homens e 292 mulheres no poder.
Os dados estão no trabalho A Mensuração da Desigualdade de Gênero: um Índice para os Estados Brasileiros, da estudante de economia Luísa Cardoso, premiado pelo Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF). Luísa propõe a criação do Índice Nacional de Desigualdade de Gênero (INDG) capaz de medir, por estado, o acesso das mulheres à educação, saúde, economia e política.
A estudante se baseia no Índice Global de Desigualdade de Gênero (do inglês Global Gender Gap Index - GGGI) medido pelo Fórum Econômico Mundial em 135 países, no qual, em 2012, o Brasil aparece em 62º lugar. “O Brasil não tem um índice próprio. O GGGI considera variáveis que não fazem parte da nossa realidade. O INDG seria uma forma de monitoramento das desigualdades brasileiras e pode ser atualizado constantemente”, justifica a autora.
Com base em dados de 2009, 2010 e 2011 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Congresso Nacional e outros bancos de dados oficiais, ela aplicou a escala internacional de 0 a 1, na qual quanto mais próximo a 1, maior o nível de igualdade para cada estado brasileiro. No total, o Brasil obteve 0,71 ponto. Se utilizado o INDG, o país estaria na 45ª posição no ranking mundial.
Na escala, Santa Catarina, com 0,676, aparece como o estado mais desigual, enquanto Rio Grande do Norte (0,779), como o estado com maior igualdade de acesso, seguido por Roraima (0,776) e Maranhão (0,768). O resultado mostra que a desigualdade não está ligada a uma menor renda, já que o Rio Grande do Norte tem quase metade (R$ 456,94) da renda per capita de Santa Catarina (R$ 864,51) de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (Pnad) 2009.
“O Brasil tem uma desigualdade regional imensa. Mensurar isso com dados nacionais é mais interessante e confiável. Embora a discriminação por gênero, uma das principais causas da desigualdade, não possa ser medida por dados quantitativos, ela continua existindo na sociedade como um todo”, afirma a integrante do colegiado de gestão do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), a socióloga Nina Madsen.
A socióloga explica que a discriminação começa na educação e se estende ao mercado de trabalho, prejudicando os salários e as promoções de mulheres a altos cargos. Segundo Nina, um dos fatores da diferenciação é que as mulheres ainda são responsáveis ao mesmo tempo pela produção e reprodução, o que faz com que acumulem funções.
O acesso à economia teve pontuação 0,730, quase igual ao índice nacional. Já a política foi a área com os menores índices: o Brasil obteve 0,102. O estado de Santa Catarina aparece mais uma vez em última posição (0,035), seguido por Paraná (0,044) e Ceará (0,055). Os primeiros lugares também se repetem: são Rio Grande do Norte (0,404), Maranhão (0,321) e Roraima (0,273).
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil aparece como penúltimo país do ranking da América Latina em representatividade política: somente 9% dos candidatos eleitos são mulheres. “É preciso uma reforma de âmbito partidário para inclusão de mulheres. Tem que haver um trabalho de base, de trabalho junto à sociedade, para que as mulheres tenham mais destaque em propagandas políticas”, afirma a oficial de Monitoramento e Avaliação do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no Brasil, Juliana Wenceslau.
A secretária nacional de Articulação Institucional e Ações Temáticas da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Vera Soares, afirma que o governo tem se esforçado para diminuir as desigualdades. “Os países mais produtivos são os que têm menor desigualdade de gênero. É onde se aproveita melhor a capacidade produtiva e onde se utiliza o capital humano de maneira mais completa. Ganha o mercado, ganha o governo e ganham as pessoas.” Ela informou que a secretaria discute a elaboração de indicadores complexos, como o INDG.
Fonte: Agência Patrícia Galvão
Os dados estão no trabalho A Mensuração da Desigualdade de Gênero: um Índice para os Estados Brasileiros, da estudante de economia Luísa Cardoso, premiado pelo Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF). Luísa propõe a criação do Índice Nacional de Desigualdade de Gênero (INDG) capaz de medir, por estado, o acesso das mulheres à educação, saúde, economia e política.
A estudante se baseia no Índice Global de Desigualdade de Gênero (do inglês Global Gender Gap Index - GGGI) medido pelo Fórum Econômico Mundial em 135 países, no qual, em 2012, o Brasil aparece em 62º lugar. “O Brasil não tem um índice próprio. O GGGI considera variáveis que não fazem parte da nossa realidade. O INDG seria uma forma de monitoramento das desigualdades brasileiras e pode ser atualizado constantemente”, justifica a autora.
Com base em dados de 2009, 2010 e 2011 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Congresso Nacional e outros bancos de dados oficiais, ela aplicou a escala internacional de 0 a 1, na qual quanto mais próximo a 1, maior o nível de igualdade para cada estado brasileiro. No total, o Brasil obteve 0,71 ponto. Se utilizado o INDG, o país estaria na 45ª posição no ranking mundial.
Na escala, Santa Catarina, com 0,676, aparece como o estado mais desigual, enquanto Rio Grande do Norte (0,779), como o estado com maior igualdade de acesso, seguido por Roraima (0,776) e Maranhão (0,768). O resultado mostra que a desigualdade não está ligada a uma menor renda, já que o Rio Grande do Norte tem quase metade (R$ 456,94) da renda per capita de Santa Catarina (R$ 864,51) de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (Pnad) 2009.
“O Brasil tem uma desigualdade regional imensa. Mensurar isso com dados nacionais é mais interessante e confiável. Embora a discriminação por gênero, uma das principais causas da desigualdade, não possa ser medida por dados quantitativos, ela continua existindo na sociedade como um todo”, afirma a integrante do colegiado de gestão do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), a socióloga Nina Madsen.
A socióloga explica que a discriminação começa na educação e se estende ao mercado de trabalho, prejudicando os salários e as promoções de mulheres a altos cargos. Segundo Nina, um dos fatores da diferenciação é que as mulheres ainda são responsáveis ao mesmo tempo pela produção e reprodução, o que faz com que acumulem funções.
O acesso à economia teve pontuação 0,730, quase igual ao índice nacional. Já a política foi a área com os menores índices: o Brasil obteve 0,102. O estado de Santa Catarina aparece mais uma vez em última posição (0,035), seguido por Paraná (0,044) e Ceará (0,055). Os primeiros lugares também se repetem: são Rio Grande do Norte (0,404), Maranhão (0,321) e Roraima (0,273).
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil aparece como penúltimo país do ranking da América Latina em representatividade política: somente 9% dos candidatos eleitos são mulheres. “É preciso uma reforma de âmbito partidário para inclusão de mulheres. Tem que haver um trabalho de base, de trabalho junto à sociedade, para que as mulheres tenham mais destaque em propagandas políticas”, afirma a oficial de Monitoramento e Avaliação do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no Brasil, Juliana Wenceslau.
A secretária nacional de Articulação Institucional e Ações Temáticas da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Vera Soares, afirma que o governo tem se esforçado para diminuir as desigualdades. “Os países mais produtivos são os que têm menor desigualdade de gênero. É onde se aproveita melhor a capacidade produtiva e onde se utiliza o capital humano de maneira mais completa. Ganha o mercado, ganha o governo e ganham as pessoas.” Ela informou que a secretaria discute a elaboração de indicadores complexos, como o INDG.
Fonte: Agência Patrícia Galvão
Nuevo feminismo se sube a las paredes de Brasil
Por Fabiana Frayssinet
RÍO DE JANEIRO, ene (IPS) - Anarkia Boladona hace de las paredes de las calles de Brasil un
instrumento contra la violencia doméstica. Autodefinida como una
"grafitera política feminista", la artista representa una nueva
corriente por los derechos de las mujeres que busca lenguajes menos
académicos, más osados y populares.
La entrevista transcurre en movimiento. Anarkia Boladona, nacida como
Panmela Castro, está pintando un mural frente a una escuela municipal
del suburbio de Río de Janeiro, junto a otras jóvenes.
Pero a diferencia del pasado, cuando comenzó a pintar paredes como "pichadora", ahora las autoridades la apoyan.
"Ya tenía el hábito de escribir en las calles desde adolescente y después comencé a dibujar. Cuando pasé al dibujo vi que a las personas que pasaban les gustaba y comentaban al día siguiente", cuenta a IPS.
La grafitera comenzó a pintar paredes "por indignación" hasta que descubrió que podía utilizar sus dibujos para "contribuir con algo" que sirviera a su comunidad, un suburbio pobre de Río de Janeiro.
"Por ser parte de una familia de mujeres, una de las temáticas que percibía era la de la violencia contra la mujer. Siempre estuvo muy presente en mi vida, por mis hermanas, mis primas, mis tías", recordó.
La transición hacia lo que llama un "feminismo político grafitero", tuvo que ver también con su origen familiar. Mujeres "influenciadas por la revolución feminista de los años 70".
"Al mismo tiempo que estaban presas al casamiento y al patriarcado, eran mujeres que entendían que todo estaba caminando para ser diferente. Yo y mis primas fuimos criadas de una forma diferente de ellas", agregó.
La educación fue diferente, y el camino escogido para luchar por los derechos de las mujeres también. Hoy, con 31 años, se siente parte del feminismo de una nueva generación.
"Creo que las feminista antiguas tenían que ser muy radicales para romper los estereotipos. Por eso tenían esos conceptos muy fuertes, como el de no explotar el cuerpo ni la imagen del cuerpo", explica.
Habiendo luchado en el pasado por un mundo "sin sostenes", hoy estas nuevas feministas no dudan en sacárselos si es para defender una buena causa por sus derechos.
"Avanzamos tanto que nuestra pelea no es más por ejemplo para no explorar la imagen del cuerpo sino para usar nuestro cuerpo de la manera que queremos y aún exponiéndolo. Tenemos la opción de trabajar con nuestro cerebro, con nuestro cuerpo, de la manera que se nos dé la gana", analiza.
La grafitera escogió "trabajar" con su arte con las paredes como su instrumento. Las utiliza para retratar los dramas sufridos por millones de mujeres. A veces la pintada comienza con una representación teatral.
El mural que la grafitera está haciendo es contra la violencia de la mujer. Un número de teléfono les indica a dónde acudir para pedir auxilio.
La ley María da Penha, aprobada en 2006 para combatir la violencia doméstica y familiar contra la mujer, aumentó el rigor de las penalizaciones hasta llegar a la de cárcel.
Un informe del Instituto Sangari indica que una mujer es golpeada cada cinco minutos en Brasil, siendo responsables del ataque en 70 por ciento de los casos novios, maridos, exparejas o familiares.
Los temas de los murales de Anarkia Boladona no se agotan. Un mundo mítico femenino de flores, libélulas, Evas, brujas apelando a un mundo con igualdad de derechos laborales, culturales, libertad sexual.
"Yo lucho principalmente por la igualdad de género. Que las mujeres tengan los mismos derechos que los hombres y, cuando digo derechos, no es solo en la ley. Es un derecho de igualdad cultural también", dice Anarkía Boladona.
Silvana Coelho, de 23 años, participa del mural. Dentro de un ambiente considerado revolucionario como el de los "pichadores" callejeros, supo de qué se trataba esa lucha cultural.
"Es un mundo de hombres. Yo sufría mucho acoso de los propios artistas. A veces me llamaban a pintar ya con segundas intenciones. Pero yo me enojaba y les decía: ‘soy artista de la calle, no soy de esas mujeres cualquiera de calle, estoy aquí para hacer mi arte’", relata a IPS.
Mientras la pintura del mural avanza, aumenta la curiosidad entre hombres y mujeres. Un grupo de señoras, que se enorgullece de tener en promedio más de 90 años, aprueba la obra.
"Antes era muy difícil que un hombre le pegara a una mujer. Ahora hay hombres que además de sacarle el dinero a su pareja, le pegan", comenta la jubilada Francisca de Oliveira, de 92 años.
Un abuelo con sus dos nietas también contempla la obra. "Hay personas que usan este arte para denigrar para desmoralizar. En cambio el arte de ellas levanta, hace reflexionar, educa, y en la calle, o sea que es accesible para todo el mundo", comenta el gráfico Mauro Torres.
"Es importante, porque hay personas que maltratan a las mujeres", reflexiona su nieta Ingrid da Costa, de nueve años. La niña es parte de una generación que, según Anarkia Boladona, hoy vive nuevas temáticas feministas.
A la grafitera le preocupa que, así como en el pasado la lucha era la libertad sexual, hoy las preadolescentes y adolescentes de la fuerte "cultura del baile funk" de las favelas (barrios pobres y hacinados) se sienten obligadas a tener relaciones sexuales porque "sino su novio las deja por otra".
"Hay una inversión de papeles. Antes la obligación era mantener la virginidad. Hoy la obligación es no ser mas virgen", compara.
A veces las paredes no alcanzan para abordar tantos temas. Por eso la grafitera fundó una organización llamada "Nami" (mina al revés, que en el lunfardo carioca quiere decir mujer), que usa las artes urbanas para promover el derecho de las mujeres, especialmente de las más pobres.
Daniele Kitty, estudiante de arte y vicepresidenta de Nami, tuvo que enfrentar a sus padres que no aceptan "que una mujer ande pintando por ahí". "En verdad, yo estoy aquí como ustedes ven haciendo un trabajo", dice.
Se trata de un trabajo que Nami usa para acercarse a las mujeres que ni tienen acceso a un diario.
"No se puede ignorar un mural así. Termina siendo casi como un mensaje comercial en la televisión. Un mensaje subliminal que de tanto ver una y otra vez cuando pasas, queda en tu cabeza", sostiene.
El mural aludido llama a poner "fin a la violencia contra la mujer". Una mujer flor que pintó Coelho lo complementa.
"La mujer es sagrada, una flor que hay que cuidar de no lastimarla. Hay que regarla con agua pero también con amor", interpreta.
(FIN/2013)
Pero a diferencia del pasado, cuando comenzó a pintar paredes como "pichadora", ahora las autoridades la apoyan.
"Ya tenía el hábito de escribir en las calles desde adolescente y después comencé a dibujar. Cuando pasé al dibujo vi que a las personas que pasaban les gustaba y comentaban al día siguiente", cuenta a IPS.
La grafitera comenzó a pintar paredes "por indignación" hasta que descubrió que podía utilizar sus dibujos para "contribuir con algo" que sirviera a su comunidad, un suburbio pobre de Río de Janeiro.
"Por ser parte de una familia de mujeres, una de las temáticas que percibía era la de la violencia contra la mujer. Siempre estuvo muy presente en mi vida, por mis hermanas, mis primas, mis tías", recordó.
La transición hacia lo que llama un "feminismo político grafitero", tuvo que ver también con su origen familiar. Mujeres "influenciadas por la revolución feminista de los años 70".
"Al mismo tiempo que estaban presas al casamiento y al patriarcado, eran mujeres que entendían que todo estaba caminando para ser diferente. Yo y mis primas fuimos criadas de una forma diferente de ellas", agregó.
La educación fue diferente, y el camino escogido para luchar por los derechos de las mujeres también. Hoy, con 31 años, se siente parte del feminismo de una nueva generación.
"Creo que las feminista antiguas tenían que ser muy radicales para romper los estereotipos. Por eso tenían esos conceptos muy fuertes, como el de no explotar el cuerpo ni la imagen del cuerpo", explica.
Habiendo luchado en el pasado por un mundo "sin sostenes", hoy estas nuevas feministas no dudan en sacárselos si es para defender una buena causa por sus derechos.
"Avanzamos tanto que nuestra pelea no es más por ejemplo para no explorar la imagen del cuerpo sino para usar nuestro cuerpo de la manera que queremos y aún exponiéndolo. Tenemos la opción de trabajar con nuestro cerebro, con nuestro cuerpo, de la manera que se nos dé la gana", analiza.
La grafitera escogió "trabajar" con su arte con las paredes como su instrumento. Las utiliza para retratar los dramas sufridos por millones de mujeres. A veces la pintada comienza con una representación teatral.
El mural que la grafitera está haciendo es contra la violencia de la mujer. Un número de teléfono les indica a dónde acudir para pedir auxilio.
La ley María da Penha, aprobada en 2006 para combatir la violencia doméstica y familiar contra la mujer, aumentó el rigor de las penalizaciones hasta llegar a la de cárcel.
Un informe del Instituto Sangari indica que una mujer es golpeada cada cinco minutos en Brasil, siendo responsables del ataque en 70 por ciento de los casos novios, maridos, exparejas o familiares.
Los temas de los murales de Anarkia Boladona no se agotan. Un mundo mítico femenino de flores, libélulas, Evas, brujas apelando a un mundo con igualdad de derechos laborales, culturales, libertad sexual.
"Yo lucho principalmente por la igualdad de género. Que las mujeres tengan los mismos derechos que los hombres y, cuando digo derechos, no es solo en la ley. Es un derecho de igualdad cultural también", dice Anarkía Boladona.
Silvana Coelho, de 23 años, participa del mural. Dentro de un ambiente considerado revolucionario como el de los "pichadores" callejeros, supo de qué se trataba esa lucha cultural.
"Es un mundo de hombres. Yo sufría mucho acoso de los propios artistas. A veces me llamaban a pintar ya con segundas intenciones. Pero yo me enojaba y les decía: ‘soy artista de la calle, no soy de esas mujeres cualquiera de calle, estoy aquí para hacer mi arte’", relata a IPS.
Mientras la pintura del mural avanza, aumenta la curiosidad entre hombres y mujeres. Un grupo de señoras, que se enorgullece de tener en promedio más de 90 años, aprueba la obra.
"Antes era muy difícil que un hombre le pegara a una mujer. Ahora hay hombres que además de sacarle el dinero a su pareja, le pegan", comenta la jubilada Francisca de Oliveira, de 92 años.
Un abuelo con sus dos nietas también contempla la obra. "Hay personas que usan este arte para denigrar para desmoralizar. En cambio el arte de ellas levanta, hace reflexionar, educa, y en la calle, o sea que es accesible para todo el mundo", comenta el gráfico Mauro Torres.
"Es importante, porque hay personas que maltratan a las mujeres", reflexiona su nieta Ingrid da Costa, de nueve años. La niña es parte de una generación que, según Anarkia Boladona, hoy vive nuevas temáticas feministas.
A la grafitera le preocupa que, así como en el pasado la lucha era la libertad sexual, hoy las preadolescentes y adolescentes de la fuerte "cultura del baile funk" de las favelas (barrios pobres y hacinados) se sienten obligadas a tener relaciones sexuales porque "sino su novio las deja por otra".
"Hay una inversión de papeles. Antes la obligación era mantener la virginidad. Hoy la obligación es no ser mas virgen", compara.
A veces las paredes no alcanzan para abordar tantos temas. Por eso la grafitera fundó una organización llamada "Nami" (mina al revés, que en el lunfardo carioca quiere decir mujer), que usa las artes urbanas para promover el derecho de las mujeres, especialmente de las más pobres.
Daniele Kitty, estudiante de arte y vicepresidenta de Nami, tuvo que enfrentar a sus padres que no aceptan "que una mujer ande pintando por ahí". "En verdad, yo estoy aquí como ustedes ven haciendo un trabajo", dice.
Se trata de un trabajo que Nami usa para acercarse a las mujeres que ni tienen acceso a un diario.
"No se puede ignorar un mural así. Termina siendo casi como un mensaje comercial en la televisión. Un mensaje subliminal que de tanto ver una y otra vez cuando pasas, queda en tu cabeza", sostiene.
El mural aludido llama a poner "fin a la violencia contra la mujer". Una mujer flor que pintó Coelho lo complementa.
"La mujer es sagrada, una flor que hay que cuidar de no lastimarla. Hay que regarla con agua pero también con amor", interpreta.
(FIN/2013)
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