( imagem colhida no google)
Embora
relativamente nova, a concepção de Economia adjetivada com a nomenclatura
Criativa vem provocando intenso debate em torno de suas reais intenções. Há
quem a acuse de legitimar uma nova espécie de capitalismo neoliberal que
estaria renovando as forças do capital agora com o aval das instâncias sagradas
da cultura. Existem ainda os que afirmam que no Brasil a política cultural de
orientação para Economia Criativa instaurada pelo MINC-Ministério da Cultura,
através da Secretaria de Economia Criativa, está completamente comprometida com
o mercado, em que só as grandes empresas lucrarão. No meio do debate existem
também os apocalípticos que falam em destruição
criativa.
Diferente dessas posições e talvez
por falar de um lugar, visto pelo Brasil ainda hoje, como um não lugar, aonde as
possibilidades criativas não estão agrupadas em torno do capital, mas
sobrevivem na garra e na coragem dos que fazem cultura; eu veja com outros olhos a Economia Criativa
e, portanto, me volte muito mais para as oportunidades postas, do que para as
possíveis nuances perniciosas de um inovador processo econômico para quem vive
de cultura.
Vale ressaltar aos que afinam as
palavras para discordar ou atacar, que tenho amplo conhecimento dos processos
econômicos voltados também para o ambiente da cultura, haja vista, minha tese
de doutorado e meu trabalho ao longo de anos em um banco estatal brasileiro, na
área de comunicação e marketing. E é exatamente por ter estudado e vivenciado o
protagonismo do campo econômico sobre os
demais campos, que tenho reclamado aqui e em outros fóruns, o protagonismo para
o campo cultural em suas dimensões: antropológica e estética.
E creiam meus poucos leitores, não
estou sozinha. A UNESCO- Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e
Cultura tem procurado aprofundar o debate em torno de um modelo desejável de
desenvolvimento em que a cultura desempenhe o papel central. Já falei deste
tema há algumas semanas em um artigo intitulado Centralidade da Cultura, quando chamei atenção para o fato de que
esse protagonismo que tanto desejamos para a cultura deve se fazer não somente
porque o campo cultural carrega em si um grande vetor de desenvolvimento, como
também porque o faz a partir das referências culturais intrínsecas que definem
e identificam as sociedades.
Para Jorge Barreto Xavier e José
Maria Lassalle, existe na sociedade contemporânea uma tendência a ver o lado
econômico como referência e essa ideia seria não apenas uma herança das teorias
e práticas capitalistas e marxistas, mas uma evidência muito além da própria
teoria, da interpretação ou da prática. Tornou-se algo tão intrínseco ao se
pensar ou se analisar as sociedades que qualquer outra perspectiva se tornou
marginal. E como afirmam os autores acima citados, não podemos em hipótese
alguma ignorar a economia nas sociedades atuais, contudo, não podemos ignorar
os demais componentes da vida em sociedade, portanto, enxergar que outros
campos contribuem para o desenvolvimento das sociedades.
Nesse contexto, a utilização pelo
campo cultural dos processos do campo econômico não pode ser uma via
negligenciada no desenvolvimento dos territórios, sobretudo, os de pobreza e de
extrema pobreza. O viés da política
cultural voltada para a Economia
Criativa deve ter em seu desenho tanto a meta do desenvolvimento holístico e aí,
não só econômico, como também, o fomento à criatividade.
Como bem disse o colega Johnson
Sales no grupo Economia Criativa Brasil, grupo aberto no Facebook, “ enxergar na Economia Criativa apenas
"o novo capitalismo neoliberal" corresponde a olhar através de um
prisma e perceber apenas um tom monocromático. A criatividade gera os impactos
mais difíceis de serem monopolizados pelos capitalistas. Ao mesmo tempo em que
pode elevar a mais-valia a níveis estratosféricos, pode também gerar produtos
intangíveis que apresentam caracteristicamente a propriedade de causar impactos
sociais de largo alcance que escapam do monopólio capitalista. A Criatividade é
o mais rebelde e anarquista dos insumos, ao mesmo tempo que é 'objeto de
trabalho' difícil de ser tomado por completo do trabalhador”.
Por outro
lado, a Cultura tem contribuído de forma significativa para a economia dos
países. Em 2010 pesquisas apontaram, após analisar o desempenho de 239 mil
empresas ativas no setor cultural no ocidente, que nelas trabalhavam 1,7 milhão
de pessoas e que as atividades culturais
obtiveram cerca de R$ 374,8 bilhões de receita líquida, despenderam R$ 329,1
bilhões de custos totais e geraram um valor adicionado de R$ 152,9 bilhões,
como bem afirma Décio Coutinho no grupo fechado do Facebook Rede Iberoamericana
Comunidades, Territórios e Economia Cultural e Criativa.
Contudo,
nessas contas estão setores como telefonia, indústria de eletrodomésticos,
dentre outros, além das antigas indústrias culturais como cinema, música e
indústria editorial. É certo que se trata de índices que contribuem para
conhecer os números da cultura e seus segmentos intervenientes, todavia,
percebo a Economia Criativa muito além dos setores criativos e culturais que
abastecem uma pujante economia dos modismos e utilizam a criatividade como
diferencial competitivo nos diferentes nichos mercadológicos, como o mercado de
automóveis ou de moda.
Eu percebo
nas possibilidades colocadas pela Economia Criativa oportunidades para
impulsionar a criatividade e a sustentabilidade dos setores da cultura que
vivem imersos em si mesmos e nem se tornam sustentáveis, pois continuam fazendo
com que os artistas necessitem de outras profissões para sobreviver; nem se
tornam visíveis para a sociedade. Esse ciclo de isolamento necessita ser
rompido porque o visível pode se tronar sustentável a partir de ações
integradas que passam pelo conhecimento dos métodos e técnicas do campo
econômico.
Portanto,
para além das críticas ácidas com referências aos mecanismos de aplicação da
política voltada para Economia Criativa há pouco menos de um ano implantada
pelo MINC, vale pensar além das teorias que privilegiam o econômico sobre os
demais ambientes, pois na economia da cultura não é a economia que deve
prevalecer, mas é a cultura que deve protagonizar o processo de desenvolvimento se
apropriando da economia, e não mais se deixando apropriar por esta, como desde
muito tempo tem sido feito, quando o mercado usa a cultura para agregar valor a produtos e serviços.
Ana Regina Rêgo
Phd em
Comunicação Corporativa. Mestre em Comunicação e Cultura. Jornalista.
Consultora. Coordenadora PPGCOM-UFPI. email: ana.rani@uol.com.br